sexta-feira, 23 de junho de 2023

Ressurgir




A lua fina como uma navalha
Despontava no céu
O frio até que era ameno
Mas lembrava aquelas noites mais longas
De frio mais intenso 
À margem do mundo
Numa casa de barro e terra
O fogo queimando
Para aquecer os corpos

Foi onde nasci
E são memórias que não tenho
Mas que fazem parte de mim
Que sentido haverá nisso tudo?
O amor, ah o amor,
Como se fosse algo mágico encontrado pelo caminho.
Já não acredito mais nesse amor romântico
Mas a fé retorna aos poucos
Como das cinzas
A fé no sentido da vida.

Terá de haver algo maior 
Que explique todas essas inquietações e sofrimentos
Enquanto vou buscando esses sentidos
Cultivo meu jardim
E tenho a certeza das vidas que brotam e se propagam.
E morrem também, como tudo um dia. 
Pra ressurgir, renascer, permanecer em espírito.


A primeira frase veio de uma memória da minha mãe, dos poemas que ela riscava à faca na máquina de costura.
A foto é do meu (nosso) jardim de 20 de junho de 2023, primeiro dia do meu ciclo menstrual. A lua fina como uma navalha não pôde ser visualizada neste Junho porque o tempo estava nublado. Escrevo na noite do dia 23.

terça-feira, 6 de junho de 2023

Para ver o sol

 

Há poesia na rosa
E também no espinho.
Tenho muitos sonhos
Gritos desesperados
Vozes rebeldes
E algumas doses de insensatez.

Canto sons inebriantes
Habito noites sem sono
Tenho palavras não ditas
E voando em torno de mim
Mosquitos verdes da incompreensão.

Há poesia no grito
E também no silêncio.
Ouço muitas vozes
Não tenho voz!
E grito no silêncio perturbador da melancolia,
Sempre correndo para ver o sol.

Poema escrito em Pelotas, 30 de maio de 2004. Fotografia do sol nascendo na praia do Moçambique, em 02 de novembro de 2020.

domingo, 4 de junho de 2023

A paz da morte

 

Chegando
Eu vi aquela paz.
Que paz era aquela?
Paz da guerra entre os mortos.
Paz doente, após a tempestade devastar.
 
A paz silenciosa do medo não abandona.
Segue sempre dentro de nossos corações.
Dias feios de angústia
Dias de paz sem ter havido equilíbrio.
 
Paz da fome dos que descansam em paz.
E há cinzas
Do incêndio das vozes caladas
Pra manter a paz cruel,
Fétida, inescrupulosa. 

Paz,
Para não ferir teus olhos com o caos.
O preço da paz é nosso sangue.
E não é paz à teu lado,
É guerra.
 
Escrito em Pelotas ago/set 2001. 
Fotografia de dezembro de 2021.